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domingo, 23 de dezembro de 2012

12 - A INVESTIGAÇÃO


A madrugada primaveril de uma abafada de Porto Algre anuncia mais um tórrido verão gaúcho e
enche os bares e calçadas da boêmia Cidade Baixa. Também ajuda na insônia de um
quase aposentado funcionário público, o perito policial Adelar.
Os últimas notícias da imprensa local desencadearam uma avalanche de perguntas e geraram
um turbilhão de respostas no cérebro do servidor do Instituto Geral de Perícias.
Adelar tenta buscar na luminosidade ruidosa da rua José do Patrocínio, com as centenas
de personagens notívagas que para lá convergem atrás de êxtase etílico e sexo barato,
uma distração para o turbilhão em que mergulhou a mente que deveria estar em repouso nesta noite.
O dia tinha sido cansativo e Adelar sentia-se esgotado, mas algo o mantinha em pé até
altas horas.
Ele relembrava mentalmente do corpo extendido do juiz Benetton, encontrado morto dentro de um
banheiro da sala 804 do fórum Central. Aparentemente atingido por um fulminate ataque cardíaco.
É estranho, pois os ultimos exames de rotina feitos pelo juiz não apontavam esta possibilidade.
Também relembrou o caso do inquérito 611724208. Na época, ao examinar as imagens
de uma camera instalada dentro do cofre onde o processo estava protegido,
Observou que uma sombra muito estreita, como a de uma corda, movia-se fora do campo da tela.
Tinha se intrigado com esse pequeno detalhe, mas deu de ombros para o fato.
Tempos depois, outro caso: o prisioneiro 1665-B, detido numa prisãoi de segurançla máxima.
Era um assaltante de bancos evadido, que se envolveu num tiroteio com muitos mortos e feridos.
Foi encontrado estirado no chão da cela, com os braços abertos e olhos esbugalhados, ao lado
de uma carreirinha de cocaína altamente pura.
Como a droga entrou lá?
Um filete de sangue seco no pescoço, denunciou um corte certeiro, talvez de uma lâmina afiadissima,
que decepara a traquéia e a carótida.
Como e quem cometera o assassinato dentro de uma área tão protegida?
As imagens das cameras de segurança não captaram nada. As celas continaram trancadas e
so foram inspecionadas quando o preso naõ respondeu a chamada.
Quando chegou na cela para cobrir a cena do crime, viu que tinham "lavado" o
vaso sanitário, que segundo os carcereiros, estava todo "borrado" de fezes, mas
o cadaver estava limpo e a autópsia não revelou que o assaltante não tinah feito uso
do tal vaso antes de morrer.
O perito Adelar saca de um cigarro, quebrando o jejum que prometera a si mesmo de abandonar o vicio.
Ele traga e dá umas baforadas aspergindo uma nuvem no ar, incrivelmente parado sobre Porto Alegre.
O que ele vê na fumaça são mais vultos de mais fantasmas que agora querem lhe afugentar a paz.
Ele vê um paciente termina, um homem no leito de morte, que parecia dormir um sono eterno, com um leve sorriso nos lábios,
após alguém ou alguma "coisa" ter cortado fios e tubos que conectavam o enfermo aos aparelhos mantenedores das
funções vitais. E o hospital e secretária da saude até hoje estão "investigando" o que aconteceu.
Ainda tem o caso do sequestrador que foi capturado "morto" depois de ter sido "imobilizado" por uma "serpente" metálica,
como descreveram as duas única reféns e vítimas do meliante. Porém, estranhamente, tanto o delegado
que atuou na ação quanto o tenente que invadiu a loja após um tiroteio que alegaram vinha de "dentro para fora" do prédio,
não realtaram nada de "anormal" nesta ocorrência.
Só que as fotos tirada poela perícia do local do crime indicavam a presença de que alguma "coisa rastejante"
teria se movimentado pelo chão do local.
E o que dizer de um achado incrível: um "pendrive" instalado em um roteador dentro do cofre do mais moderno e
seguro datacenter do sul do País? Até agora ninguém soube dizer para que serve e quem o instalou!
O fato assustou o Secretário Municipal Adjunto para Assuntos "Estratégicos", que ordenou a abertura de
Inquérito Administrativo e encaminhou o caso para o Ministério Público, que remeteu  para o titular
da Vigésima Delegacia especializada em crimes cibernéticos. Passados quarenta dias, a
investigação resultou vazia de respostas. O delegado chegou a indiciar um analista de sistemas
responsável pela segurança do DataCenter, mas desistiu de levar as acusações contra o funcionário
adiante.
Adelar tentava mentalmente ligar todos os casos, etabelecendo um elo de ligação entre eles.
O que lhe chamava a atenção era os indícios sempre apontavam para alguma "coisa" misteriosa
sempre presente nas cenas dos crimes: um rastro deixado por alguma coisa
"rastejante", mas que, curiosamente, sumia no meio do caminho, com se tivesse sido
propositadamente "apagado".
-Apagado? Por quem?
No cenário da cela, ele fotografou as mesmas marcas se afastando do ponto onde o preso
tombou em direção ao fundo da cela, mas somem subitamente.
No caso do juiz Beneton, idem.
Já no hospital, os mesmos sinais de que alguma "coisa" teria visitado a U.T.I. antes
de consumar o assassinato.
A viúva parecia, estranhamente, tranquila e com um olharpacífico e tranquilo ante à perda súbita
do marido.
E o que pensar do sequestrador? As vítimas juraram ter visto uma "enorme serpente" atacando o
meliante. Na loja também havia sinais de que algo se arrastara até ali, mas os mesmo também "sumiam"
no meio do caminho, que indicava o fundo da cela, onde só tinha um vaso sanitário instalado.
Súbitamente Adelar é pércorrido por um choque que lhe percorre a coluna de ciam a baixo.
-É isso! Só pode ser isso!
Ele pega o celular e disca nervosdamente para um colega do Instituto Geral de Pericias.
-Alô?
-Sou eu cara, o Adelar!
-Há...O que você quer?
-Eu acho que desvendei o mistério da morte daquele assaltante de bancos.
-Jura? E como é que se deu?
-Ouve bem: o que acabou com o cara, deve ter saído de dentro do vaso sanitário, se arrastando e...
-Tá...tá...e essa "coisa" seria o quê? Um crocodilo?
Interrompido, Adelar foi pego de surpresa pela ironia do colega.
-Que é que isso meu brother? Tá me gozando?
-Não me leva mal caraq, mas essa tua teoria cai bem em roteiro de cinema, mas quero ver quem
é que vai te apoiar nessa.
-Ainda não sei o que é que saiu de dentro do vaso e...
-Não se preocupe Adelar. Chame um biólogo. Vai ver foi um "alligator" transgênico, sedento por
fazer justiça e...
O colega do IGP não terminou de falar e a ligação foi interrompida.
Adelar desligou furioso. Não aguentou a zombaria.
Decidiu que iria investir na prórpia tese e provar ao mundo que há algo mais
misterioso sob os pés dos Porto Alegrenses  do que sobre a superfície.
E fica fitando a imagem de uma sombra em uma das fotos sobre a mesa, que revela uma
sombra comprida, se esgueirando pelo canto direito da cena.
Passa o dedo indicador pelo borrão e bate nele três vezes.
-Você é meu e vou pegá-lo.
Fala em voz baixa enquanto cofia a barba rala.
==============



FIM DESTE EPISÓDIO
 

sábado, 15 de dezembro de 2012

11 - A COISA - "A EVOLUÇÃO"


A madrugada no porto de Porto Alegre é pertubada por figuras furtivas, que se agitam dentro do armazém D1.
Os homens que por ali se batem estão descarregando o conteudo de um enorme caixão de metal, um container, enviado em um navio
direto de Cingapura. A loga viagem terminou em terras gauchas, mas por precaução e para não chamar a atenção,
a carga do container só foi descarregada após o anoitecer.
Os homens obdecem as orientaçãoes de um senhor, que insiste em usar umn chapéu antiquado feito de feltro.
Acompanhando tudo, o olhar observador de um jovem e idealista engenheiro fica extasiado quando um dos volumes
envelopados em uma das caixas de madeira descarregada do container, reluz na luz tênue das luminárias do armazém.
É um objeto cilindrico e metálico, envolto em palha de vime e bolinhas de isopor.
O cavalheiro de chapéu, que também observa o objeto, comenta que é a evolução da técnica.
O objeto chama a atenção. Parece um imenso anelídeo, desses que normalmente se encontra ao escavar
a terra úmida dos jardins. O aço polido reflete imagens distorcidas do ambiente, mas tanto
o engenheiro e o cavalheiro de chapéu conseguem se dinstiguir entre as distorçoes refletidas, mas o
olhar deles é de deslumbramento diante do novo modelo da "coisa".
-Rapaz-susurra o velho-este "projeto" inovou. Agoa teremos mais "autonomia" em nossas "ações".
-Quais os avanços esse novo modelo apresenta? O rapaz está ansioso por uma resposta.
-Eu compreendo tua ansiedade. A fala do velho é calma e tranquila.
E continua:
-Este sistema é totalmente novo. Não vamos mais necessitar de um motor diesel para
movimentar o "extenser" por todo o trajeto. Esta unidade é totalmente automata. E ela
se "arrastará" até o destino, não importando as dificuldades do trajeto.
O velho fala enquanto estica o olhar para o engenheiro, para medir as reaçoes
dele diante de cada palavra.
-A "unidade"-prossegue o velho-tem três hastes que se projetarão para fora
do corpo principal, fixando-a nas paredes internas da tubulação. Em seguida
estenderá para frente um prolongamento do corpo principal. Dele sairão
outras três pinças, que também se fixarão nas paredes do duto invadido.
O jovem engenheiro ajeitaqva o óculos o tempo todo, como se quisesse ajustar
o foco para ver melhor.
-Então,-prossegue a voz pausada e rouca do velho-as primeiras hastes são
recolhidas e a extensão do corpo é recolhida, e este movimento de retração
puxa o restante do corpo da "coisa" cada vez mais adiante, e assim ela
vai percorrendo todo o itinerário programado.
-E a fonte de energia para isso tudo?-quiz saber o engenheiro.
-Já esperava esta pergunta. Ela provém do metano pré-existente dentro das
tubulações. Este modelo da "coisa" foi projetado com uma
célula compacta de reciclagem de metano em energia para os
sistemas embarcados nela. E no ambiente em que ela transitará há combustivel
de sobra.
-E como vai fazer para recuperá-la?
-Ora meu ingênuo jovem.A "coisa" fará os movimentos inversos para retornar
para a base. E através do GPS, poderemos monitorar cada metro percorrido.
-E como o senhor resolveu a questão da comunicação? Não ficará prejudicada?
-Pensamos nisso também. Para isso abusamos da tecnologia de celular. E para aumentar
a eficiência, a "coisa" terá suporte de um longo cabo óptico. Teremos
velocidade de transferencia de daos muito superior à melhor banda larga digital
existente no mercado.
-Porque tudo isso? Não ficou caro demais?
-Jovem, no nosso "meio" os resultados devem imediatos e precisos. Não pode
haver falhas. Muitos dos "membros" da nossa "organização" são devotos à ela.
Eles todos tem uma divida de "gratidão" com o grupo. Isso é que dilui os
possíveis custos.
-Senhor...-o engenheiro não chega a terminar o que estava iniciando a dizer
e é interrompido pelo ancião:
-Você terá a honrra de fazer o batismo desta "coisinha" espetacular. Será
a nossa próxima "ação" e com a nova tecnologia. E quer saber qual é?
Falou e esticou um olhar penetrante para o jovem.
O engenheiro faz um meneio com a cabeça confirmando a curiosidade.
-Vamos pregar um "susto" no governador e dentro do palácio do governo.
O olhar do jovem se espanta ante o sorriso inigmático do homem de chapéu de feltro,
que já não sabia se de entusiasmo ou sadismo.

============

Fim deste episódio.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

10 - O DATACENTER


               
                                             

O projeto da Prefeitura estava concluído: um prédio novinho em folha, para abrigar
um moderníssimo centro de armazenamento de dados digitais, o "datacenter".
Dezenas de grandes computadores, com alta capacidade de memória e processamento
tinham custado uma pequena fortuna.
O alto investimento se justificava: o governo queria garantir que somente um punhado de privilegiados tivesse acesso restrito aos servidores, para onde todos os dados dos cidadãos e da cidade deveriam migrar.
Um sofisticado sistema de proteções eletrônicas foi incorporado ao projeto, para evitar acessos indevidos ou não autorizados. O prefeito garantiu pela imprensa que nada, nem ninguém conseguiria romper as barreiras criadas para proteger as informações armazenadas no "datacenter".
Um controle biométrico de reconhecimento de digitais e escaneamento de retina foi desenvolvido para identificar aqueles contemplados com acesso à sala dos comutadores mais potentes da cidade.
Tudo isso não foi o suficiente para barrar os Snakers.
O caminhão Scania, carregando nas entranhas da carroceria um artefato idealizado por engenheiros obcecados por desafios, manobra tranquilamente pelas ruas que compõe o quarteirão onde está instalado o datacenter.
Câmeras de rua acompanham a movimentação do veiculo na Central de Monitoramento do comando de vigilância do município, mas sem despertar suspeita de quem observa as manobras do caminhão.
O motorista posiciona o caminhão em cima de uma tampa metálica circular, destas que são normalmente encontradas no piso das ruas e que escondem redes quilométricas de galerias enterradas sob o solo das cidades.
Um alçapão no assoalho do baú do caminhão é aberto e através dele vultos abrem a tampa metálica chumbada no asfalto.
-Está aberto. Vamos iniciar a entrada. Falou um dos vultos que habitam o baú.
Imediatamente o motor do Scânia ronca mais possante e um longo tubo de material sintético, parecido com P.E.A.D.. desce para dentro do poço.
Dentro deste tubo vai embarcada a "coisa", que  segue por dentro das tubulações  de esgoto enterradas, penetrando cada vez mais em direção ao "alvo": a inexpugnável sala-cofre do novíssimo "datacenter".
Alguns minutos depois, e à dezenas de metros de distância do caminhão, a "cabeça" da "coisa" atinge um
poço de formato cônico, onde encontra duas aberturas, por onde escorrem filetes de dejetos. Fica indecisa por alguns segundos, mas num movimento rápido escolhe a abertura da esquerda e nela se enfia.
Percorre todo um trajeto por dentro de canos, passando por diversas  caixas de passagem, onde encontra outras aberturas, mas toma decisões precisas que terminam conduzindo-a até o telhado do prédio do "datacenter".
Lá em cima, procura pela torre de resfriamento do ar condicionado.
Assim que a identifica, nela se esgueira.
Impulsionada pela força mecânica do poderoso motor do caminhão, a "coisa" agora desce por um duto de ar condicionado até atingir a câmara de filtragem: um prisma em formato de paralelepípedo recheado de mantas de um material poroso, parecido com lã ou feltro.
Nesta câmara faz um furo na parede da mesma e penetra nesta nova passagem, "caindo" no interior da sala de maquinas, já dentro do prédio. A "coisa" prossegue na busca obstinada pelos servidores de internet, por onde circulam os dados mais sigilosos de várias secretárias de governo.
Se contorce para lá e para cá, tal qual um réptil, sempre em busca da "presa".
Alcança um ponto de uma ala da sala todo  preenchido por um emaranhado de tubos que lembram um ninho de minhocas gigantes se enroscando umas nas outras.
Balança a "cabeça" para cima e para baixo, enquanto uma luz violácea que se projeta de um "olho" vasculha o ambiente. Fica parada por uns dois minutos, como se estivesse indecisa. De repente, se agita e se estica até uma plataforma de onde parte o emaranhado de tubos. É o "shaft" que procurava: coluna do edificio por onde passam tuboe e fiações que conectam todos os pavimentos do edifício.
Penetra neste "canal" e viaja por ele, subindo mais ainda.
Uma vez lá em cima, localiza uma outra abertura, não maior que duas polegadas, pintada de verde e fechada por uma tela fina de arame.
Usando de uma luz muito intensa e vermelha, a "coisa" derrete a tela para abrir caminho e penetra na  pequena abertura.
Segundos depois, a "coisa" está dentro da inexpugnável sala.
Sempre se arrastando e contorcendo-se pelo chão, a "coisa" estaciona diante do painel de roteadores: uma caixa envidraçada, com uma dezena de prateleiras pequenas, de onde partem feixes de cabos coloridos, todos numerados, cada um ligado a uma luz tênue e piscante.
A "coisa" abre a portinhola da caixa utilizando pinças que se projetam da parte anterior da "cabeça".
De um compartimento localizado no dorso do corpo cilíndrico, retira uma espécie de "pen-drive", que encaixa habilidosamente numa porta USB, como um soquete, localizado no painel traseiro de uma das prateleiras.
-"Está feito"-Foi o grito de exaltação do operador dentro do baú do caminhão Scânia.
Depois de tudo isso feito, a "coisa" fecha a portinhola da caixa envidraçada com toda a delicadeza e começa a recuar, se retirando pelo mesmo caminho que usou para entrar, sempre borrifando um liquido azulado, apagando os indícios que denunciassem a invasão.
Hora e meia depois, o caminhão põe-se em movimento, abandonando o local.
Na sala de monitoramento da vigilância, um supervisor nota o movimento e num instinto, resolve salvar a imagem captada pela câmera de segurança da rua.
Enquanto isso, em outro ponto da cidade, no distante bairro Humaitá, um homem envergando um chapéu de feltro brinda com a equipe: eles acabam de mostrar para um agente do S.N.I., da extinta agencia de informações secretas do governo federal, o que os Snakers são capazes de fazer.

Fim deste episodio.

sábado, 20 de outubro de 2012

9 - DÍVIDAS


Enquanto uma adormece, outra Porto Alegre se mantém insone no
quarteirão formado pelas ruas João Alfredo, República e Lima e Silva.
O burburinho das bandas se apresentando ao vivo nos diversos bares é
mesclado às vozes e ao ronco de motores dos playboys desocupados, que por
ali vagueiam, engrossando a multidão aglomerada nos estreitos passeios públicos.
Isso tudo compõe uma irritante melodia para o azar dos moradores
que teimam em querer dormir cedo. A madrugada avança espalhando odores
etílicos e ureicos pelas calçadas e muros do boêmio bairro Cidade Baixa.
Uma mar de copos plásticos sujos já cobre o asfalto e certamente logo
entupirão os bueiros na próxima chuvarada.
Um enorme caminhão de cinco eixos, todo carenado e adornado com acessórios
que lembram aqueles "truks" muito comuns nos filmes de ação americanos,está estacionado
desde o incicio da noite na rua Republica, quase defronte ao colégio de padres
"O Pão dos Pobres". Embora parado tanto tempo, não desperta a curiosodade
dos eventuais pedestres. O motor ecológico de última geração,
gira, mas de maneira quase silente. Quem passa próximo da carroceria nem percebe que um "nevorsismo"
toma conta do interior do enorme baú. É dali que partem a energia e as ordens
para que a "coisa" se  movimente de forma obediente em direção ao alvo: um
edificio envidraçado no outro lado da av Borges de Medeiros.
Este edificio é sede da filial sulista de uma financeira, a Ivestimenta, ligada ao banco Espanhol Alquires.
A finaceira é nacionalmente conhecida pela sede por investimentos de baixissimo risco, seguindo a cartilha
dos CEOs espanhóis: o máximo de lucro pelo menor custo possível.
A avenida Borges de Medeiros é importante via de acesso ao centro da cidade e está distante não
mais que duzentos metros perpendicularmente à rua Republica, que também é paralela a elegante
avenida Praia de Belas.
O caminhão está tão próximo do edificio que é possivel visualizar o interior das salas pelas janelas
esquecidas abertas. 
A "coisa" se contorce lentamente, à procura de uma entrada para o edificio, apartir
do ponto onde está estacionado o caminhão.
Tudo que "Vê" e "sente" é transmitido em tempo real para a Central de Controle,
que está instalada em algum discreto pavilhão comercial do bairro Humaitá, lá no
extremo norte da cidade.
Após idas e vindas, a "coisa" encontra um ponto de acesso ao interior do prédio.
Através de um sistema de localização, parecido com o "G.P.S.", os operadores
da "coisa" monitoram o progresso da engenhoca dentro das entranhas do espigão.
Pacientemente, cômodo por cômodo é visitado e fotografado.
De andar em andar, a "coisa" se arrasta silenciosamente pelo chão, sempre
retornando ao ponto de origem quando tem que abandonar o local visitado.
Dentre os diversos dispositivos embarcados nela, um chama a atenção: é um "apagador"
de rastros. do tipo químico, que anula qualquer tentativa de identificação
por peritos abelhudos de possíveis evidências ou provas.
Por ser de pequeno porte e não ter peso representativo, os sistemas convencionais
de alarme não são acionados pela presença da visitante misteriosa.
A "coisa" ainda enxerga no escuro e vasculha o ambiente ao redor, pois
está dotada de câmeras especiais que lhe permitem executar uma varredura em detalhes
do local invadido.  Nada escapa à análise dos dados coletados, feita por poderosos algoritmos
especialmente elaborados para este fim. Tudo gera um turbilhão de
informações que vai inflando os bancos de memória dos computadores da
Central de Controle. Um computador-servidor  recebe e consome estes valiosos dados e pode definir
em uma fração de segundo qual será a melhor estratégia ou movimento,
otimizando ao máximo as ações da "coisa".
Esta inteligencia artificial busca sempre como resultado um "serviço" limpo
e sem "erros".
Enfim, a "coisa" é a mão eficiente do crime perfeito.
As tentativas de entrar num setor protegido do edificio se mostraram nulas.
Isto obrigou a interferencia humana. Uma conferencia entre os engenheiros operadores, os
chamados "Snakers", e o mentor da organização-que insiste usar um antiguado chapéu de feltro-define
uma ousada estratégia: entrar pela torre de resfriamento do ar condicionado
localizada no terraço, e descer até a área protegida pelo duto de ventilação
da sala 504.
Esta sala é uma espécie de caixa forte, inacessível ao cidadão comum.
Somente membros do alto escalão têm acesso simultâneo ao interior da sala, mediante cartões de senhas criptografadas e
todos os movimentos são acompanhados por um sistema de TV interno.
Isto não assusta um "Snaker".
-Sem problema, responde ao celular o operador de óculos de fundo de garrafa,
sentado na frente de vários monitores e operando uma espécie de "mache"
de avião e respondendo ao chefe da organização no "viva voz".
-Aqui vamos nós! continuou ele enquanto movimenta alavancas e pressiona botões em um painel ao lado.
O motor do Scania ronca mais forte e imediatamente a "coisa" é inpulsionada pelo
caminho "alternativo". Em poucos minutos ela atinge a saída do duto, que está fechada
com uma grade de proteção pelo lado de dentro da sala-cofre.
-Não tem importância, rosnou o operador dando de ombros ao comentário de um colega diante do obstáculo.
 O operador aperta ums botões e da cabeça da "coisa" uma luz
vermelha e intensa vaporiza a fina grade de metal, abrindo uma passagem através do duto.
-Entramos! Foi o grito de vitória de todos os que compartilharam a imagem
que chegava aos receptores, tanto da Central de Controle quanto dentro do bau
da carroceria do caminhão Scania.
A "coisa" desliza pela parede até o nível do chão e se estica, tal como uma naja, para rastrear o
ambiente. Localiza o ponto-alvo que procurava: uma gaveta em um armário de aço,
dotada de fechadura. Porém, ela está trancada.
-Só pode ser essa! falou o homem do chapéu de feltro, examinando a imagem em um monitor.
-Abram! ordenou em seguida.
Da "coisa" se ejetam três pinças que mais lembram dedos de uma mão alienigena.
Delicadamente o ciborgue introduz uma das pinças no buraco da fechadura e com movimentos
calculados, faz a trança se abrir, expondo o conteudo da gaveta.
A mão robotizada tateia os documentos que encontra e seleciona uma pasta com capa cinza, feita de plástico,
onde se lê "Reis e Irmãos Participações S/C" na etiqueta.
Abre a pasta e folheia uma série de páginas timbradas e numeradas sequencialmente.
A equipe do Centro de Controle descobrte que se tratam de debentures.
O documento é minuciosamente analisado. Cada página estudada é logo em seguida
borrada por uma tinta preta, através de um esguicho instalado numa das pinças.
Assim a "coisa" vai operando até a última página existente dentro da pasta cinza.
Concluido o "trabalho", a gaveta é fechada e a "coisa" retorna pelo mesmo
caminho por onde entrou, apagando todas as pistas da "visita", borrifando um produto químico volátil
pelo caminho de retorno.
Os Snakers comemoram, e da Central de Controle parte uma ligação
para um angustiado executivo, um "CEO" da holding Reis e Irmãos Participações:
-O "serviço" foi feito com perfeição. As debentures originais foram
inutilizadas.
Comunicou o de chapéu para o jovem engravatado, que sentado
atrás de uma elegante mesa de mogno, instalada em um escritório da avenida Paulista, na cidade
de São Paulo, recebia como carícias aquelas palavras emitidas pelo telefone.
-Muito obrigado meu "amigo". Não sabe o peso que estes papéis representavam para mim.
Não sei como retribuir o favor. Isto vai me dar mais oxigênio para respirar.
-O que vais fazer com o resultado dessa "operação" não nos interessa. Quanto ao pagamento,
já lhe disse que a moeda de troca é lealdade e segredo. Se algum dia necessitarmos
de seus préstimos, pode ter certeza de que será chamado para quitar a divida de hoje.
-Certo, certo. Vou aguardar pelo seu contato então...
O jovem "CEO" não teve tempo de concluir a frase. O homem de chapéu de feltro desligou o telefone
murmurando algo inaudível, mas que se o jovem executivo engravatado escutasse,
não iria ter motivos para respirar tão aliviado.
-O-O-O
Vinte dias depois, três diretores da Ivestimenta olham estarrecidos para a documentação
contida na pasta de capa cinza. Não acreditam no que estão vendo.
Fazem diversos telefonemas simultãneos e nervosamente discutem entre si.
Um deles, o mais idoso, começa a balbuciar palavras desconexas e desaba no chão, para
o desespero dos outros acompanhantes, que gritam por socorro.
A "Reis e Irmãos Participações cobrou na justiça a capacidade da
Ivestimenta de resgatar os valores multimilionários dos contratos de preço futuro.
Os autores já sabiam que a Investimenta iria buscar nas debentures emitidas contra
a Reis e Irmãos Participações uma resposta ao litígio.
Isto foi estopim da implosão da finaceira da Investimenta, que não pode demonstrar
capacidade de realizar as inversões de valores diante dos demais acionistas.
Os papéis da Reis e Irmãos Participações representavam um quarto de todas as operações do
banco  espanhol Alquires no Brasil.
Centenas de milhões de dólares  simplesmente "evaporaram".
Um mês depois, o Banco Central decreta intervenção na Investimenta
Num jatinho particular Lear Jet cruza o oceâno Atalântico, levando os executivos da
Reis e Irmãos Participações, que brindam com champanha francesa em meio a valises recheadas
de notas de cem dólares.
Porém, somente um deles não sorri nem comemora.
É o jovem "CEO" que rememorava as ultimas palavras do homem de chapéu de feltro, que conhecera
na praia de Canasvieiras:
"...pode ter certeza de que será chamado para quitar a divida de hoje..."


Fim de mais um episódio.





segunda-feira, 24 de setembro de 2012

8 - O ARAPONGA


                                              
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O ARAPONGA

A noite deita o manto escuro sobre Porto Alegre compondo um jogo instável de sombras com a luz tênue das luminárias no alto dos postes.
Uma garoa fina e gelada cai incessantemente. Tudo é silêncio nas ruas do Jardim Planalto.
Dentro de uma loja térrea, de um moderno edifício comercial da avenida Adda Mascaranhas de Moraes, algo move-se sorrateiramente.
Silente, uma "criatura" não desperta a atenção do alarme de ultra-som e muito menos do vigia noturno, que na portaria a poucos metros dali, assiste uma gravação de um programa de entrevistas, supostamente
transmitido "ao vivo" pela televisão.
Nesta loja se instalara o comitê de uma coligação política, que reuniu uma dezena de partidos de todos os matizes, compondo uma colcha de retalhos, onde até velhos adversários juntaram forças para vencer a candidatura que governa a cidade e quer se manter no poder.
A "coisa" vagueia pelos ambientes separados por divisórias de "m.d.f.".
Recebendo comandos oriundos da Central de Controle, localizada em um pavilhão discreto do bairro Humaitá, a geringonça procura um alvo específico.
Após um momento de indecisão, ela se estaca diante de uma porta fechada.
A cabeça da "coisa" gira para lá e para cá, observando os painéis da divisória.
Ergue-se, apoiada no próprio corpo e alonga-se, tal qual uma naja, até alcançar uma esquadria entreaberta próxima ao teto. Contorcendo-se, esgueira-se para dentro do cômodo, tocando suavemente o chão, como se fosse um réptil descendo de uma árvore.
As lentes e sensores especiais de que é dotada, faz com que a "coisa" enxergue o que os olhos humanos não podem ver. Controlada à distância, ela vasculha o ambiente. Se dirige até o lado oposto à porta de entrada da saleta. Localiza e se posiciona diante do painel traseiro do computador que está sobre uma mesa. Automaticamente, um conjunto de pinças se projetam da cabeça da "coisa", formando uma mão com apenas três dedos. De um compartimento que se abre atrás do dorso do longo corpo cilindrico, é retirado um objeto semelhante a um "pen-drive". Com precisão,a mão cibernética o instala numa  porta "u.s.b." disponível. Imediatamente um indicador luminoso começa a piscar num quadro de comando, dentro do baú de um caminhão Scania de cinco eixos, estacionado no quarteirão mais próximo do prédio do comitê.
Todos os dados coletados pela geringonça anelídea viajam como a luz por um longo feixe de fibra ótica.
A energia que alimenta a "coisa" também percorre o mesmo itinerário, através de cabos especiais de alumínio.
No centro de Comando, os operadores vibram.
A meta foi concluída com êxito. O dispositivo intalado vai interceptar todo o fluxo de dados entre a estação de trabalho e o servidor, aproveitando as propriedades das senhas dos eventuais usuários daquele computador.
Um vírus infectará os sistemas e dará pleno controle da intranet alheia, burlando as barreiras criadas pelo "fire-wall" do servidor.Todo o tráfego de dados, com todas as informações sigilosas será repassado aos políticos inescrupulosos, solicitantes dos "serviços" da "organização". Remotamente  controlada, a "coisa" investiga o conteúdo das gavetas e armários, abrindo pastas e escaneando textos. Todos os materiais são filmados. Terminado o "trabalho", a "coisa" recolhe as pinças e recua, voltando pelo mesmo caminho que tinha feito para entrar no prédio. No interior do baú do caminhão, vultos se agitam. Eles tem pressa.
A "missão" foi concluída com êxito e eles tem de partir para longe dali. O motor ronca, recolhendo a "queridinha" daqueles espectros enclausurados na carroceria. Os agentes meliantes agora podem respirar aliviados. Ninguém viu ou notou algum movimento. Foi um "trabalho" limpo!
Agora vão poder voltar para a "base".

O-O-O-O

Diante do monitor de um computador, lá na Sala de Controle, do pavilhão no bairro Humaitá, um homem sexagenário se mantém impassível. Ele sabe o alcance da influencia que a "missão" recém encerrada pode ter sobre os destinos da politica.
Ele pega o celular e digita um numero. No outro lado da linha, uma voz rouca e feminina o congratula pelo feito. Ela o questiona sobre o "valor" dos "serviços" prestados.
Relutante, Ele responde que o "preço" será bem mais salgado que os resultados políticos futuros que os "contratantes" possam usufruir.
A entonação da voz ao telefone "congela" a investida da mulher no outro lado da linha.
A voz rouca emudece.
A dona desta voz sabe com quem está lidando.
Sem trocar mais palavras, ELE termina a chamada.
E debaixo das abas de um chapéu de feltro antiquado, ele lança um olhar frio direto nas imagens da propaganda politica estampada nas paredes, que a "coisa" acabara de enviar para o monitor na Central de Controle, direto do interior do comitê invadido.

O-O-O-O

Fim deste episódio.

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

7 - O EXILADO

         
          
O noticiário acordou a cidade com manchetes disparadas por dezenas de repórteres acampados diante da embaixada do Uruguai em Porto Alegre. Um homem está lá dentro pedindo asilo, alegando perseguição política. As noticias desencontradas concordam num único ponto: o perseguido pretende escapar de uma extradição, pois está no rol dos foragidos da INTERPOL. Ele é procurado pelos governos onde teria cometido crimes de terrorismo e assassinato. O consulado uruguaio não se manifestou quanto ao pedido de abrigo, para não gerar uma crise diplomática com os governos ofendidos, que imediatamente reclamaram a deportação do criminoso.
           A relutância da diplomacia platina em não atender o clamor internacional gerou protestos mundo afora. O representante uruguaio foi convocado pelo governo brasileiro a dar explicações, e o apoio dado ao asilado pelas organizações de direitos humanos, engrossou o caldo de ofensas e ameaças de retaliação entre os litigantes, instaurando uma crise política na região do Cone Sul. O governo norte-americano solicitou ao seu escritório para assuntos latino-americanos um acompanhamento do caso. O governo brasileiro emitiu apenas evasivas conclamando as partes ao diálogo, para não se envolver na questão. A imprensa internacional, ávida por mais espetáculo, publicou uma lista de atos supostamente cometidos pelo fugitivo. Em capítulos, como se fosse uma novela, foram ilustrando com gráficos e fotos, de assaltos à bancos até explosões em trens de passageiros, com estatísticas de mortos, feridos e prejuízos espalhados.
         -Todos os delitos foram praticados pelo grupo chefiado pelo senhor Arthur, que é o verdadeiro nome dele.
         A fala grave do porta-voz do governo inglês aos jornalistas era enfática: dentro da embaixada latina estava um assassino frio e sanguinário. Ele devia ser preso, deportado e julgado pelos diversos crimes que cometera.         
        As declarações do diplomata provocaram a ira dos grupos simpatizantes do asilado, amontoados defronte à embaixada castelhana. Com palavras de ordem gritavam que todas as acusações eram suposições de uma farsa. A trama era destinada a sacrificar um inocente. Berravam com amplificadores de som que não sairiam dali até que os uruguaios e brasileiros garantissem salvo conduto ao sujeito, que queria ir viver em Montevidéo.
        Os ânimos foram se elevando.
        O choque entre quem apoiava um lado e outro não tardou acontecer. As agressões verbais deram lugar a uma briga generalizada entre a polícia e as turbas que digladiaram numa luta campal. Bombas de efeito moral e cacetadas foram democraticamente distribuídas. Lojas fecharam as cortinas e moradores correram de um lado para o outro tentando escapar da violência, enquanto carros eram incendiados e pedras  voavam como foguetes.
       Enquanto isso, negociações tensas no meio diplomático tentavam amainar os efeitos que a presença indesejada do terrorista estava causando em solo nacional.
       -Não é possível que os uruguaios mantenham ele lá indefinidamente. Cabe a nós dar um “salvo conduto” para ele sair do país, mas se fizermos isso estaremos provocando uma crise maior ainda. Falou um alto funcionário brasileiro ao premiê inglês.
       -Vocês não podem fazer isso sem o aval internacional. Contrapôs o bretão, num português crivado de sotaque.
       -Vamos evocar a Soberania de Estado. Isto é direito internacional reconhecido. Porém, só o faremos se não houver uma saída negociada para o impasse. Insistia o representante tupiniquim.
      -Estudem a questão com delicadeza. Tenha certeza de que os apoiaremos, desde que os nossos interesses não sejam ignorados. O inglês levantou-se da poltrona macia e após uma despedida rápida dos demais presentes naquela reunião, deixou a ampla sala do Ministério das relações exteriores. Os presentes se entreolharam com certo desânimo.
       -E agora, o que faremos? O cônsul uruguaio foi convocado, mas até agora não nos deu resposta. O clima está muito ruim.
       Argumentou um homem calvo que trajava elegante terno cinza, riscado de azul, combinando com a gravata de grife.
      -O presidente já foi comunicado. Isto já foi além da diplomacia. Agora é entre Chefes de Estado.
       Respondeu o que tinha acabado de falar com o bretão.
0-0-0-0-
       Enquanto isso, na zona sul de Porto Alegre, numa mansão encravada no alto do morro São Caetano, um senhor sexagenário olha para a bela vista que tem do rio Guaíba pela vidraça do mirante construído justamente para isso. Ele tenta aliviar a angustia que o oprime desde que se instaurou a crise política. O exilado foi um companheiro de lutas passadas, que agora se tornou inconveniente. Com a visão da paisagem e uma tragada no cachimbo de marfim, tenta relaxar, mas não consegue. Volta-se quando o telefone toca. Um secretário particular atende ao chamado e lhe repassa o telefone:
       -Senhor Orquiz, do consulado.
       -Obrigado Hortz. Pode sair e me deixar só?
         O sexagenário e dono da mansão, sabe que um pedido seu é uma ordem, que  prontamente é atendida pelo subordinado fiel.
        -Boa tarde, “sir”! Falou o milionário, e uma voz familiar no outro lado da linha retrucou:
        -Ele voltou.
      -Sim, ele mesmo. Respondeu o sexagenário à voz rouca que denuncia problema nas cordas vocais do interlocutor.
        -Tempos ruins esses. Isto lhe parece o quê? Pergunta Orquiz, num tom de voz que só quem viveu muito tempo em terras setentrionais pode ter.
       -Parece um pesadelo. Ele não podia ter surgido em pior hora. Pensei que ele estivesse morto.
       -Mas não está e agora nos põe em uma situação delicada. Pode nos deixar sem cobertura. Contrapôs Orquiz ao velho conhecido do outro lado da linha, que não esperou que completasse a frase:
         -Temos que por fim nisso agora. Ele não pode sair do país, isto seria um desastre.
         A  suplica vinda de longe pelo telefone recebeu o rebote de um tom rude e enérgico na resposta de Orquiz, que ecoou por todo o mirante da mansão:
         -Não se preocupe, velho amigo. Ele não vai sair vivo daquela embaixada.
          -Orquiz...Orquiz! Tome cuidado com o que vai fazer. Não nos exponha ou ele dará com a língua nos dentes e aí sim, estaremos perdidos.
          -Não se preocupe. Confie em mim. Nunca deixo uma pendência para trás. Tenho plena confiança num pessoal altamente especializado, que vai resolver este impasse para nós e fazer um “serviço” limpo.
           O velho amigo de outros tempos, do outro lado da linha, desabou numa caríssima cadeirinha de aproximação - um entre tantos itens exclusivos de quem tem muito dinheiro para gastar - parecendo que o coração vai lhe saltar pela boca;
           -Por favor Orquiz, por favor, é tudo que lhe peço, não nos exponha. Os últimos que contrataste em Santiago só fizeram  merda. Foi muito difícil limpar toda a sujeira. E...
            Não completou a fala e foi cortado pela voz de Orquiz:
            -Desta vez nós acertaremos. Não se preocupe, amigo. Tudo vai dar certo. Confie.
            Orquiz desligou e o amigo, hoje um abastado milionário, ficou olhando para o aparelho na mão.       
       Ele levantou-se e se arrastou pelo amplo ambiente. Olhou demoradamente para uma moldura envidraçada, na qual pendiam medalhas e honrarias recebidas em outras épocas, pendurada acima da lareira. Foi quando combatia supostos comunistas em vários lugares do planeta. As insígnias perderam o significado nos atuais tempos. Eram lembranças que deviam há muito estarem enterradas, mas sempre alguma coisa escapava do controle  e emergia como um pesadelo do passado. Um passado de muita morte, muitas mentiras e muito dinheiro “sujo”. Voltando ao presente, ele faz um chamado pelo secretário. Começou a se sentir suado e o velho coração lembrou-se dos defeitos da idade. O velho saiu à procura do remédio para a taquicardia, com as mãos tremulas e ofegante, que sempre usa debaixo da língua nas crises agudas. O secretário surge na porta e na hora soube: o patrão teria de ser levado para o hospital.
-0-0-0-
               Alguns dias depois....
          Em outro ponto da mesma cidade, próximo da quadra onde se localiza o prédio da embaixada uruguaia, um caminhão Scânia de cinco eixos se movimenta lentamente, procurando um lugar para manobrar e estacionar. Dentro do baú, técnicos manipulam alavancas e computadores. Recebem ordens vindas de longe, da Central de Controle. Eles dão vida ao arauto, a "coisa". A rua defronte ao consulado está bloqueada e vigiada dia e noite pela policia. Os manifestantes foram afastados e mesmo assim, permanecem fazendo algum barulho por ali.
            Dentro do prédio, o pivô da crise, já barbeado e de banho tomado, saboreia uma refeição oferecida pelos anfitriões. Ele sorri, despreocupado com os últimos acontecimentos. Enquanto conversa e degusta nacos de assado de javali ao vinho do porto, vai tracejando planos para o futuro: comprar uma fazenda e criar gado de corte nobre. Questionado como fará isso, ele argumenta que tem “algum” dinheiro guardado. Um companheiro de prato lembra que ainda não chegou resposta do governo brasileiro para o translado seguro até o aeroporto. O ex-terrorista para de comer por alguns instantes, fica apreensivo, mas ignora o comentário.
            Após aprovar o manjar que lhe fora oferecido, o fugitivo da INTERPOL diz que vai para a suíte destinada aos hóspedes, acompanhar  as noticias pela televisão. Levanta-se da mesa e se despede, sob o olhar parado dos que nela ainda estavam.
            Arthur entra no quarto e se tranca. Debaixo da cama retira uma maleta tipo 007. Abre e confere o conteúdo: barras de ouro, celular via satélite, documentos falsos e uma pistola .45, carregada para alguma eventualidade. Era tudo o que ele julgava precisar para recomeçar a nova vida, se tudo desse certo, tal como planejara. Ele tinha algumas autoridades uruguaias “na mão” e não seria difícil obter o visto permanente. O problema estava em solo brasileiro, mas ele ia deixar a diplomacia uruguaia resolver. Que eles se virassem. Algumas autoridades platinas lhe deviam isso. Liga a televisão sem prestar a atenção na programação. Aumenta o volume. Pega o celular e tecla alguns números. Fica aguardando até que alguém atende.
            -Alô! Diz uma voz feminina que recebeu a ligação.
            -Sou eu. Estou falando da embaixada. Prepare tudo. Logo, logo vou sair daqui.
            -Já conseguiu salvo conduto?
            -Ainda não, mas está quase lá. Eles não vão me deixar na mão, depois de tudo que fiz. Eles sabem que não podem....
            Um ruído de algo sendo arrastado interrompe a concentração do terrorista, que se desliga do telefonema e procura com o olhar a origem do barulho. Instintivamente saca a pistola e a engatilha. Ele tomba o telefone na cama enquanto a mulher no outro lado da linha continua a falar, sem saber que não está sendo mais ouvida. Ele se levanta e caminha com desconfiança até o banheiro. Cuidadosamente empurra a porta para aumentar o ângulo de visão. O banheiro da suíte é amplo para acomodações destinadas à hospedes. Ele não consegue ver muita coisa na penumbra e procura o interruptor na parede, ao lado da porta, com a mão direita, enquanto empunha a arma na outra mão. Procura aguçar os sentidos. Quando enfim os dedos tocam o interruptor e acende a luz, o fugitivo leva um susto e se joga para trás, desequilibrando o corpo enquanto aperta o gatilho. Uma “coisa” que só tinha visto em telas de cinema de terror avança em sua direção. Ele aperta o gatilho e vários tiros da arma de repetição se espalham pelas paredes e teto. Ele tenta inutilmente mirar no “alvo”, que se movimenta com agilidade impressionante. A “coisa” é mais rápida e se lança num bote mortal contra o homem, que com olhos esbugalhados berra por socorro. Os outros habitantes da embaixada correm com armas em punho. Há um alvoroço dentro e fora do prédio da embaixada. O cônsul é o primeiro a ser levado para o sub-solo, num movimento ensaiado à exaustão pelos seguranças. Na rua, os policiais atônitos sacam das pistolas e disparam ordens para controlar a turba, que ameaça romper os cordões de isolamento. No corredor que dá acesso aos quartos do primeiro andar do prédio da embaixada,  os agentes esbarram na porta do quarto de hóspedes trancada por dentro. Como não sabem o que está acontecendo, gritam pelo infeliz que está trancado no aposento. O que escutam é somente o alto som da televisão. Um oficial dá ordem para arrombar a porta e a mesma é posta no chão aos chutes. Os seguranças avançam apontando as pistolas em todas as direções e a única visão que eles tem é a do terrorista jogado no chão, ainda com a arma descarregada na mão. Ele está com os olhos arregalados e  numa expressão de pavor. Um segurança aproxima o ouvido do rosto da vitima, estirada no meio do quarto. Um som quase inaudível sai da boca do criminoso mais procurado do planeta: “é um monstro”.
         Balbuciou  e se silenciou para sempre, para espanto de todos aqueles agentes armados e boquiabertos.
-0-0-0-
          Quinze dias depois e após a imprensa ter divulgado uma nota da embaixada uruguaia lamentando a morte do ilustre hospede, alegaram foi "suicídio por overdose de paralisante muscular", que não conseguiram identificar. Não explicaram as circunstancias em que se deu a “intoxicação”. O corpo foi levado para um crematório e as cinzas enviadas para o país de origem do terrorista. Todos os que foram prejudicados pelas ações do terrorista no mundo, se rejubilaram: a justiça finalmente foi feita. Os governos envolvidos, ficaram perplexos, mas silenciaram os respectivos embaixadores.
         Enquanto isso, no bairro Teresópolis, numa mansão do Morro São Caetano e diante do mirante, um senhor sexagenário bebe uma taça de vinho do porto dividida com seu amigo Orquiz. Brindam o desfecho súbito dos últimos acontecimentos. Estão aliviados e confraternizam enquanto olham para o majestoso e plácido Guaíba, enquanto o  Sol desenha uma imagem semelhante a uma serpente sobre o lago. A mesma que um homem, dono de um chapéu de feltro, também enxerga lá em Ipanema, sentado à mesa de um restaurante defronte a orla.

terça-feira, 21 de agosto de 2012

6 - REFÉNS

O expediente se inicia como todos os dias: ela é a primeira a chegar.
Abre a cortina de ferro da loja de roupas femininas que a irmã resolveu abrir numa galeria da rua Mostardeiro. Acende as luzes, desliga o alarme e abaixa a cortina o suficiente para deixar a porta semiaberta, para que as outras funcionárias possam também entrar no estabelecimento. Faz um ano que o negócio prospera, com excelentes vendas e lucros. Ela e a irmã já pensam em ampliar a loja. Dirige-se para o fundo da loja, onde estão os caixas, o depósito e a escada que dá acesso ao mezanino e administração. Confere algumas notas no caixa e sobe para o escritório. Antes, passa numa pequena copa e prepara o costumeiro café. Da copa vai até o vestiário e põe o uniforme azul com emblema da loja. Entra no escritório e liga um dos computadores.
Neste momento, ouve um barulho de algo caindo no chão. Pensando ser algum colega de trabalho, não presta atenção e se volta para a tela do monitor. Ouve passos rápidos subindo a escada. Resolve se levantar chamando pelo nome da sub-gerente Márcia e quando aponta o nariz no pequeno corredor, leva um susto: um homem magro, de jaqueta e touca, lhe aponta um revolver.
-Fica quieta e entra aí! Berra ele para ela que dá um grito agudo tardio.
 Ele avança e a empurra para dentro do escritório com violência.
-Calada! Onde é que tá o cofre? Vomita! Cadê o cofre? Urrou o estranho enquanto a sacudia pelo braço. Nisso ouve outros passos.
-Noêmia? Você está aí?
O sujeito arregala os olhos e enfia o cano da arma contra o rosto da assustada vitima:
-Quem é essa? Não vou perguntar de novo. A apavorada, já rezando a quinta prece, tenta controlar o choque e balbucia:
-É...é...a minha colega...falou tremendo toda.
-Fica quietinha. Nem um “psiu”.
Os dois ficaram em silêncio. Marta subiu a escada e se dirigiu à copa. Como estava vazia, seguiu pelo corredor e estacou qual um poste.
Noêmia estava chorosa, de pé ao lado de um estranho e com uma arma apontada para a cabeça.
-Aí! Isto é um assalto, mané! Vou fazer essa loja hoje. Você fica quietinha e entra! Não quero queimar ninguém. O malandro passeava o cano da arma pelo ar, indicando a porta da sala.
Marta sentiu as pernas tremerem, mas obedeceu.
Entrou e foi empurrada para dentro. Elas estavam nervosas e trêmulas.
-Pega o que quiser, mas solta a gente. Falou Noêmia, quase engasgando.
-Cala a boca! Já te disse o que quero! Rosnou enquanto esfregava a arma no peito dela.
Marta olhava para a outra e não sabia o que dizer.
-Cadê o maldito cofre? Vociferou e olhou com raiva para as duas apavoradas.
Enquanto isso, um policial militar chamado por um taxista, que viu o homem aproveitar o vão da cortina para entrar na loja, faz um ruído que desperta a atenção do meliante. O mesmo reage iniciando um tiroteio dentro da loja.
O soldado se atira pelo vão ainda aberto da porta e corre para se abrigar atrás de um carro estacionado. O homem de touca empurra as mulheres para o fundo da loja, gritando e gesticulando muito. O soldado chama reforços e em minutos o local está cercado, com um formigueiro de policiais fervilhando, e o transito é interrompido. Uma equipe de Tv vai ao local e começa a cobertura dos eventos numa transmissão ao vivo. Negociadores chegam e travam uma batalha verbal e psicológica com o infrator, que passa a fazer exigências para soltar as reféns.
O comando da polícia reluta em atender aos blefes do criminoso e um plano de invasão da loja é elaborado. Pela televisão, os parentes das vítimas se desesperam. Correm para o local, mas a policia os mantém longe do cenário. Assim, a tentativa de assalto frustrada inicia um longo e tenso período, digno de filmes de cinema. O homem desconhecido dispara em direção do térreo para intimidar e grita ameaças contra as reféns se não for atendido. A polícia não sabe como preservar a vida das duas seqüestradas e pegar o meliante.
O dia corre. Dez horas depois, em outro local...
Um telefonema nervoso faz o dono do chapéu de feltro se encontrar com um outro homem tenso, numa praça no centro de Porto Alegre.
-Não me olhe assim. É minha sobrinha que está na mão daquele delinqüente e assassino.
O homem, que solicitara um encontro urgente com o porta-voz da misteriosa "organização", fumava muito, com longas tragadas. De cabelos escuros e tez morena, aparentando não mais de cinqüenta anos, explanava para o de chapéu, os últimos acontecimentos de que teve notícia pela televisão. Descreveu a angústia ao saber de que um parente é uma das seqüestradas. Narrou a “via crucis” pelos meandros da polícia para obter informações, sempre respondidas em gélidas evasivas e declarações de que tudo estava sob o controle. Resolveu apelar para todos conhecidos, quando uma amiga lhe deu um cartão com o holograma de uma serpente. Ela lhe contou que foi ajudada pela “organização” e que se tornou uma “seguidora” fiel, por isso lhe indicava um caminho pouco ortodoxo para salvar a sobrinha cativa.
-Acalme-se. Não se consegue nada se estando nervoso. Tenha calma. Pediu o homem debaixo de abas curtas sombreando os olhos claros.
-Escute aqui: me disseram que só você pode resolver isso e acabar com este seqüestro..
-Quem disse?
-Esta pessoa. O homem mostra para o de chapéu de feltro a foto de uma mulher. Prontamente a reconheceu: é a esposa que queria aliviar a dor do marido com uma doença terminal.
-Reconheço esta pessoa, mas como posso ter certeza de que ela conversou com o senhor? O olhar do homem de chapéu vasculhava algum sinal delatador de mentira no rosto do outro.
O interlocutor lhe alcança um cartão com o holograma. O homem de chapéu de feltro observa o cartão na mão do tio aflito e toma uma decisão.
-Muito bem. Vou interferir no trabalho das autoridades e salvar sua protegida. Fique o senhor sabendo que estará em dívida comigo.
-Eu pago. Diga-me o valor que eu pago.
O homem de chapéu, em pé e defronte para o outro, dá um sorriso e explica:
-Não estou interessado no seu dinheiro. Dentro em breve terás notícias minhas.
Tão logo acabou de falar, virou-se e sumiu na confusão da rua, abandonando o tio da vitima no meio da praça. O sujeito ficou tão extasiado com a atitude daquele senhor misterioso, com um chapéu fora de moda, que pensou ter sido uma péssima idéia ter pedido ajuda para um estranho. Neste momento, o pai de uma das vitimas liga logo em seguida após a curta conversa no meio da praça:
-E aí? O que conseguiu? Fala de uma vez!
-Não sei. Não conheço este cara, mas parece seguro de si e falou que vai ajudar. Só não disse como.
-Eu estou temendo pela vida dela!
-Olha, vamos procurar a policia novamente e ver se eles nos dizem algo. Também estou nervoso com a situação. Depois eu te ligo.
Desligou o celular e mirando o largo à frente, virou-se e tomou rumo em direção ao Palácio Da polícia.
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Três horas após, em outro ponto da mesma cidade.
Um caminhão Scânia de cinco eixos manobra numa rua calma, fora da área isolada pela policia, mas próximo o suficiente do perímetro vigiado pelas forças de segurança. O motorista vasculha a região com uma câmera de trezentos e sessenta graus, instalada no teto do baú, sem sair da cabine e através de um monitor.
Pelo fone acoplado na orelha, recebe e transmite informações.
-Tá tudo limpo. Posicionado em cima da “estação”. "Tá ligado"?
Ele aguarda o retorno, que não demora:
-Ok! Vamos iniciar o procedimento. Engate o motor.
-Ok!
O motorista movimenta uma alavanca e aciona uns botões no painel. O motor possante do caminhão responde com um ronco característico de ter subitamente se acelerado, para logo em seguida girar quase sem ruído.
Dentro do baú da carroceria, fechados dentro do caminhão, silhuetas se movem.
Um conjunto de monitores e computadores brilham.
Um alçapão é aberto no assoalho do chassi do veiculo. Homens movimentam outra pesada tampa de ferro que se encontra logo abaixo do caminhão.
-Posicionem logo que vamos iniciar a viagem.
Ordenou um dos homens envolvidos na operação.
-Manda ver-falou outro deles.
Imediatamente a “coisa” se põe em movimento. Tudo o que ela “vê” e “sente” é diretamente transmitido para uma Sala de Controle, localizada num pavilhão discreto em algum ponto do bairro Humaitá, na zona norte da cidade.
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Voltando à cena do crime:
Enquanto isso, no mezanino da loja, entrincheirado no vestiário junto com as reféns, o meliante negocia os termos da fuga com um tenente pelo celular de uma das vitimas:
-Quero um carro forte, com bastante gasosa, com motora e trezentos “paus” em notas de cinqüenta. Não quero policia por perto, se não mando bala, entendeu?
-Tudo bem, tudo bem, mas acalme-se, “tá” bom? Estamos providenciando.
O tenente desliga e olha para o soldado ao lado.
-Contate com as “operações especiais”. Vamos cansar ele e depois invadir. Corte água e luz e faça bastante barulho. Usa tudo o que tiver ao alcance para manter ele sempre ocupado, enquanto ganhamos tempo. Chama alguém da “especializada”, pois vamos precisar. E afasta os curiosos daqui.
O subordinado concorda num sinal com a cabeça e se retira.
O tenente fita o prédio e já imagina o “estrago” produzido se a situação piorar, mas não suspeita que perto dali, um grupo furtivo também se movimenta.
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Quarenta e cinco minutos depois, na Sala de Controle:
-Achei a entrada, é esta aqui! Aponta o “engenheiro” para uma abertura na parede de uma espécie de caixa, que aparece na imagem piscante e trêmula de um monitor.
-Vamos entrar. Falou alto outro presente na Sala.
Então a “coisa” avança silenciosamente pelas entranhas do prédio. Ora ela retrocede o movimento, ora se contorce, mas sempre avançando em direção do “alvo”.
Enquanto isso, dentro da loja, o criminoso olha para uma das jovens e se maravilha com o que vê:
-Aí gata. Tu é muito boa, muito cachorra, viu só?
-Tu “ta” na minha ou não?
Olha para ela como quem vai degustar um filé pela resposta.
Ela balança negativamente ao que ele se aproxima, puxa os cabelos de Noêmia e lhe dá um beijo violento, que ela rechaça com um safanão. Diante da reação da jovem, ele lhe dá uma bofetada.
-Tá fazendo doce é? Pois fica ligada: depois desta parada aqui, ó-balança a arma para as duas-vocês vão ser minhas “cachorras”!
E dá um sorriso debochado, mostrando uma coleção dentes muito brancos na boca.
Um ruído quebra o encantamento do aventureiro.
O marginal se apruma curioso.
Novamente outro ruído vindo do vestiário lhe desperta os instintos de sobrevivência. Faz um sinal com a arma para as duas ficarem em silencio. E elas encolhem-se abraçadas uma na outra.
O biltre move-se lentamente em direção do corredor que dá acesso aos banheiros.
Estica o olhar para dentro da peça cuidadosamente, e tremendo, empurra a porta.
-Mas que "porra" é essa?
O que vê não lhe dá tempo de pensar no que é.
Num impulso instintivo mira e ao tentar atirar, sente uma dor muito forte no peito.
Parece que todos os músculos do corpo enrijeceram.
Perde as forças e os sentidos e desaba no chão, e antes que tombe desmaiado, aperta o gatilho.
O projetil ricocheteia no chão e atravessa a vidraça de uma janela, estilhaçando-a. As duas mulheres apavoram-se, achando que serão mortas.
A policia do lado de fora, aos gritos, reage despejando uma saraivada de outros tiros, até uma ordem de “cessar fogo” é berrada pelo tenente.
As reféns miram o marginal estirado no chão, como se estivesse tendo convulsões.
Olham-se e não esperam aviso: saem dali correndo com todas as forças que possuem nas pernas.
Os agentes do Grupo de Operações Especiais lançam granadas de efeito moral e invadem a loja, armados para uma batalha campal, e se deparam com um cenário surreal: o criminoso está vivo e desacordado, tombado no chão e trêmulo. As moças são conduzidas em estado de choque para a rua.
Os policiais  levam o ladrão algemado para o hospital. Ele balbucia coisas incompreensíveis.
As reféns são acolhidas pelos parentes e colegas e a policia é ovacionada pela turba que se reuniu atrás da fita zebrada de “não ultrapasse”.
O delegado e o tenente se questionam o que teria acontecido.
Vasculham a loja para entender o que teria motivado o tiro.
Um dos soldados notou dois pequenos ferimentos no dorso do homem, mas não soube explicar a causa.
O delegado vasculha o local e constata que alguma “coisa” se arrastou por ali.
O que teria sido? O delegado tira fotos com o celular da cena e pede ao tenente que “esqueça” tudo o que aconteceu, ao que o oficial enruga o cenho sem entender a proposta.
Enquanto isso, um caminhão Scânia desliza discretamente para longe do local do tiroteio.
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Uma semana depois, na mesma praça no centro de Porto Alegre onde se iniciou este episódio:
-Muito obrigado pelo que fez pela minha família. O senhor salvou minha filha.
Falou um pai aliviado.
-Ótimo que tudo tenha terminado bem. Disse o homem do chapéu de feltro.
-O que posso fazer para lhe retribuir?
-Somente três palavras: lealdade, discrição e segredo.
Disse, sorriu e cumprimentou o outro, tirando e repondo o chapéu na cabeça, para logo sumir em meio a agitação que começava a tomar conta da praça mais famosa da cidade: a Praça da Alfandehga.

Fim de mais um episódio.

Aguardem o próximo.

domingo, 12 de agosto de 2012

5 - EUTANÁSIA: O ENFERMO


      O homem do chapéu de feltro está junto de uma mulher de meia idade, que sentada ao seu lado, na parte superior descoberta do ônibus que faz a “Linha Turismo” em Porto Alegre, rodando pelos pontos considerados “turísticos” pela Prefeitura, escuta dela lacrimosos pedidos para que “acabe” de vez com o sofrimento do marido.
     A mulher já lhe tinha mostrado o “passaporte” para atingir o objetivo nefasto à que se propunha: eliminar o marido enfermo, diagnosticado com Mal de Parkinson, preso ao leito de um grande hospital particular da cidade.
     -Como a senhora conseguiu este cartão? Falou o homem do chapéu de feltro olhando o objeto que ela balançava na sua frente e cobrando-lhe o que ELE prometera a outros antes dela: atenção ao pedido suplicante de “ajuda”.
     -Um advogado que nós dois conhecemos me repassou este cartão, com a recomendação de que eu mantivesse discrição e segredo sobre o nosso encontro. Fiquei surpreendida com a rapidez com que o senhor veio ao meu encontro. O “meu”, digo, “nosso” amigo, me aconselhou também a não perguntar o seu nome.
     O homem do chapéu olhou surpreso para ela. Ele nunca imaginou que alguém fosse optar por aconselhar outro a tratar com estranhos e anônimos, assuntos tão delicados. Tentaria explorar mais o terreno em que estava pisando. Precisava captar da mulher tudo que fosse necessário para entender as forças que a levavam tomar atitude tão extrema contra o marido. E experiência com propósitos escusos não lhe faltou em diversos “pedidos” semelhante e já atendidos.
    A mulher lhe narrou a gradual evolução da doença degenerativa, que comprometia mais e mais o sistema nervoso do marido, debilitando-o lentamente e dificultando-lhe o menor movimento, até torna-lo totalmente dependente de outras pessoas. Coisas simples e prosaicas, como levar um copo à boca para tomar uma bebida qualquer, ele já não podia mais. Ela teceu pormenores do martírio e o padecimento do marido e à situação a que ela está submetida, decretada pelo diagnóstico cruel de que ele nunca mais voltaria a ser o homem ativo que um dia ela conhecera. Entre lágrimas descreveu que ao fita-lo nos olhos, lhe perguntara qual o mais profundo desejo do resto de vida dele, e entre mal balbuciados sons proferira a palavra que iria definir a atitude dela: morte.
   O homem de chapéu de feltro a tudo ouvia calado observando despreocupadamente a paisagem do itinerário do ônibus, que por vezes alcançava a copa mais alta dos caramanchões a muito tempo plantados nas calçadas da cidade. A mulher percebendo que nenhuma reação obtinha do homem calou-se e virou o rosto para frente um pouco decepcionada. Alguns minutos de silêncio depois, o homem do chapéu se reconecta à realidade:
  -A senhora foi informada do que minha "organização" pede pelos “serviços” prestados?
   Falou lhe dirigindo um olhar azul penetrante, tentando vasculhar a alma da mulher.
 -Não temos muito dinheiro, mas se for preciso se dá um jeito. Disse ela encarando o rosto simpático do homem, que lhe parecia mais jovem no jogos de luz e sombra que a paisagem criava sobre o ônibus.
 -Não cobramos valores e sim algo muito mais caro. Disse ele sem titubear.
-O senhor tem o seu preço. Diga-me o valor para ver se posso pagar. Ela estava achando que não conseguiria nada com aquele sujeito que teimosamente se mantinha de chapéu, mesmo contra o vento que o movimento do ônibus produzia.
-Já lhe disse que não queremos dinheiro. 
 ELE continuava a perscrutar o olhar dela, que ela também retribuía fitando-o, como se trocassem uma energia misteriosa tentando uma comunicação não verbal. 
 ELE à observou melhor: os cabelos loiros, levemente grisalhos escorridos pelos ombros pequenos, o olhar castanho –“cor de tempestade”, pensou ELE- um olhar misterioso e implorando para ser explorado, o porte delicado do corpo curvilíneo dela demonstrava que uma preocupação com uma estética e elegância no vestir, que O impressionava. A boca pequena dava-lhe um aspecto de boneca, embora no rosto de traços delicados já despontassem as marcas do tempo e das agruras que sofria. Desconcertado com a situação, ELE se recompõe e desvia o olhar.
-Então me diga o senhor o que eu tenho de fazer para que me ajude? 
 Questionou ela, temendo e esperando por uma resposta que a comprometesse de alguma forma. Ela já estava desejando isso desde que vislumbrou a majestade daquele homem misterioso, discretamente trajado, cujos cabelos cinza e o olhar instigante lhe inquietara já no primeiro contato.
-Apenas vamos cobrar lealdade, discrição e segredo para com nossa "organização". Preciso que Me repasse alguns dados essenciais para o sucesso do “feito”, tais como: em qual leito e de que hospital, quem cuida dele, horários da rotina destas pessoas e quem pode interferir no nosso “trabalho”.
Ela resplandeceu num belo sorriso, que ELE evitou encarar para não demonstrar que estava esmorecendo diante de uma mulher que LHE derrubou as defesas. Ela levantou a mão para tocar-lhe em agradecimento, mas foi em vão. O ônibus freava para uma parada estratégica no mirante do Morro de Santa Teresa. ELE aproveitou e se levantou repentinamente, encarando-a  já na escada que dá acesso ao andar inferior do ônibus:
-Terá notícias minhas. 
 Num gesto de despedida, levantou e repôs o chapéu na cabeça, coberta de cabelos curtos, lisos e claros como algodão, com o melhor sorriso que pode um homem demonstrar para uma mulher, sumindo logo em seguida do campo de visão dela, que tentava segurar a ânsia de reencontrá-lo novamente.
 Dez dias depois, um caminhão baú de cinco eixos, com um potente motor Scânia realiza manobras numa rua atrás do hospital particular Sagrado Coração, localizado num bairro de classe média alta da zona sul, e comandado por freiras especialistas mais em coisas terrenas do que divinas. Dele desce o motorista gordo, enquanto o auxiliar de manobras permanece na cabine. Os dois enfiados em macacões cinza e com bonés na cabeça, vasculham o entorno. O gordo distribui cones, placas e fitas de sinalização de trânsito interrompido em volta do caminhão. Pelos fones de celular, eles se comunicam com a Central de Comando da "organização". O motorista fala para o auxiliar de manobras e apontando para o próprio olho:
-Fica esperto. Qualquer movimento você já sabe.
-“Tô ligado”, gracejou o auxiliar, verificando o campo de visão de uma câmera especial - instalada no topo do baú - num monitor dentro da cabine. O motorista abre uma porta lateral e some dentro do baú. Em seguida, um rosnar do motor indica que outro mecanismo “estranho” foi ativado e ganhou vida. O auxiliar de dentro da cabine varre a movimentação de pedestres e automóveis, transmitindo tudo para o motorista gordo, que dentro do baú refrigerado, vai ligando botões e válvulas de comando, que transmitem potência e energia para a “coisa”, que responde com violência aos comandos vindos de fora, localizado num pavilhão industrial discreto e em algum ponto do bairro Humaitá, em Porto Alegre.
-Levantei tudo sobre o hospital. Cara, tu precisa ver o luxo da coisa. Tá ligado? Parece mais um hotel cinco estrelas! Falou um impressionado jovem de óculos com um boné da Nike.
-Então te hospeda lá! Falou outro, de barba e óculos fundo de garrafa e cara cheia de sardas, rasgada por um nariz protuberante, operando uma alavanca parecida com um joystick.
-Se liguem. Nico, já baixou os arquivos? Interrompeu o gracejo  outro conhecido por “engenheiro” e que manipula uma alavanca cheia de botões parecida com “joystick” de vídeo-game, enquanto mirava a tela de um monitor LCD com imagens, em que visualizava uma sequencia de plantas baixas e perfis de um edifício. Um ponto colorido piscava intermitentemente enquanto se deslocava pelos desenhos formados por gráficos.
-Sim, já na tela. Desta vez tomei o cuidado de verificar os certificados de autenticidade.
-Ok. Respondeu o "engenheiro".
-Entramos! Anunciou o de óculos fundo de garrafa, com o olhar fixo nas imagens transmitidas ao vivo pelas lentes sofisticadas da “coisa”.
-Muito bem. Vamos seguir o plano passo à passo. Direto ao décimo andar. Comandou o "engenheiro".
Quarenta minutos depois, a “coisa” chega na ala do andar reservada ao Centro de Tratamento Intensivo. É um corredor largo, com leitos – separados por falsas paredes – monitorados e com diversos aparelhos mantenedores de vida. Todos estes leitos estão plugados aos pacientes - de diversas idades e sexo - que pouco se mexem, parecendo múmias que tentam se levantar da tumba. Um paciente não vê o outro, mas todos os leitos são observados por câmeras estrategicamente instaladas nos quartos. No meio da área fica o balcão da enfermaria e saletas destinadas aos médicos, que diante de computadores e monitores, acompanham o que acontece no andar. Ao lado das saletas fica a farmácia, os vestiários com banheiros e o almoxarifado. O andar está calmo. Não há ocorrência que exija correria e nervosismo, como sempre ocorre próximo ao momento de um óbito. Apenas uma enfermeira trabalha tranquila, fazendo apontamentos em um prontuário preso numa prancheta de metal. A “coisa” lentamente sai do “corpo” que a transportou até ali e passa por uma porta esquecida aberta no vestiário. Move-se silenciosamente, mas monitorando tudo ao redor. Qualquer movimento que se fizer próximo, a “coisa” imediatamente transmite ao “comando” instalado lá no bairro Humaitá. A "coisa" vasculha o ambiente. Percorre o corredor e se dirige a determinado leito. Parece indecisa. Recua até outro leito. Estica-se para confirmar a identidade do doente. Recolhe-se e volta. Vai até outro leito. Faz a mesma manobra.
-É ele! Alegra-se o de barba e óculos fundo de garrafa e cara cheia de sardas operando uma alavanca parecida com um joystick e de olho na imagem do homem no monitor.
-Não vamos perder tempo. Contando: um minuto! Ordenou o "engenheiro", apertando um botões, que fizeram luzes dos painéis piscarem alucinadamente.
-Agora! Eu sou o carrasco! Vociferou o da cara cheia de sardas, manipulando a alavanca qual um manche de avião com uma mão e acionado outras alavancas menores em outro dispositivo. As ordens disparadas da sala de ”comando” faziam a “coisa” reagir imediatamente. Uma aba abriu-se no dorso da "coisa" e uma espécie de cateter desenrolou-se, apontando e lançando uma luz violeta para a lente da câmera de monitoramento do hospital. A “coisa” abriu-se novamente e pinças se projetaram, formando uma mão de três dedos dotados de unhas afiadíssimas. O enfermo subitamente levantou as pálpebras e pausadamente virou os olhos para a borda do leito. O cérebro ainda ativo do homem não interpretou corretamente a imagem que enxergou, mas imaginou ser a mão suave da esposa dedicada que lhe acariciava o braço, como ela sempre fazia quando vinha visitá-lo. Porém ele queria mesmo era acabar com o sofrimento dela. Doía-lhe mais saber que ela sofria por ele, um inválido. Desejava que ela seguisse outro caminho e fosse feliz, longe daquele inferno. Vinha implorando a todos os santos que ouvissem as preces mentais que ele fazia constantemente, para que fosse levado ao encontro dos antepassados que já tinham ido.
   A mão androide moveu-se desligando e anulando alguns instrumentos. De uma das pinças ejeta-se uma fina agulha, que numa só punção despeja um líquido incolor no saco de soro pendurado numa haste acima da cama. As gotas transferem a solução direta para o corpo do homem. Ele emite um leve frêmito e em seguida adormece. A “coisa” então encolhe as pinças e fecha-se. Um sinal sonoro agudo desperta a atenção dos observadores na sala de “comando”.
-O que foi? Pergunta um deles.
-Tem alguém se aproximando.
-Temos que sair rápido. Grita o "engenheiro" ao mesmo tempo que as alavancas são movimentadas com energia e força.
A “coisa” move-se mais rápido. O ruído produzido chama a atenção da enfermeira, que se ergue da cadeira para localizar a origem do barulho. Porém ela olha para outro lado, em direção à porta de entrada da C.T.I. já aberta por um médico que lhe pergunta se se está tudo bem. Ela argumenta pensar ter ouvido um ruído, como algo metálico sendo arrastado. O médico responde que não escutou nada. A enfermeira então balança a cabeça e se senta na mesma cadeira. O médico entra na saleta e se depara com um dos monitores cheio de estática, que impedem de ver a imagem transmitida pela câmera numero cinco. Pensa ser algum defeito ou mau contato e examina os cabos do aparelho. Como não nota nada, resolve ir até o leito. Ao chegar lá fica petrificado. Não acredita no que vê. Os fios e tubos que conectavam o enfermo aos aparelhos mantenedores estavam cortados e os monitores desligados. O homem no leito parecia dormir um sono eterno, com um leve sorriso nos lábios.
O-O-O-O
Vinte e cinco dias depois, no mesmo ônibus de turismo, porém num banco na parte de baixo, já que a parte aberta estava lotada, um casal confabula cumplicidades.
-Eu estou eternamente endividada com o senhor. Não sabe o alivio e a paz que estou sentindo neste momento. Falou a mulher sem olhar no rosto do homem de chapéu feltro, sentado ao seu lado.
-A polícia e o hospital estão atônitos. Ninguém sabe explicar como foi que aconteceu. Eu mesma fiquei todos estes dias ansiosa, esperando uma notícia sua, mas só tinha o silêncio por resposta. Então, de uma hora para outra, recebo “esta surpresa”. O meu marido enfim descansou em paz. Eu posso lhe fazer uma última pergunta, continuou ela, agora fitando o companheiro de viagem, que mantinha o rosto virado para a frente, evitando olha-la.
O homem do chapéu de feltro que escutava mudo o tagarelar da mulher, apenas assentiu um sim com a cabeça.
-Ele sofreu? Digo, ele sentiu alguma dor? O olhar suplicante não teve a força necessária para demover o homem da posição em que se encontrava.
-Não. Ele não sofreu nada. Foi rápido e indolor. Partiu em paz, depois de ter adormecido.
-Obrigada mais uma vez. Eu sei que um dia terei de lhe retribuir esse favor e sei que farei isso com todo o prazer. Falou ela para ele, com a voz carregada de sentimento, quase engasgando a voz, pois desejava profundamente que de alguma forma ELE lhe cobrasse a “dívida” que tinha contraído com a “organização”. Porém, o homem de chapéu de feltro não emitiu o menor sinal de que fosse efetivamente cobrar algo dela. Apenas levantou-se, ajeitou o chapéu de feltro na cabeça e, desta vez encarando-a com um sorriso cativante, apenas lhe deu adeus, informando que um dia lhe daria notícias. Se despediu cavalheirescamente e desceu do ônibus, sem voltar o olhar para trás, deixando-a chorosa e feliz.

Fim deste episódio.